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Praedicate Evangelium. Semeraro: a Reforma não termina

“Curia semper reformanda”. O antigo axioma sobre o caminho sempiterno da reforma da Igreja vai bem com o processo de reorganização da Cúria Romana, selado mas, de fato, não concluído com a promulgação, em 19 de março, da Constituição apostólica Praedicate Evangelium. O documento, apresentado na Sala de Imprensa da Santa Sé, nesta segunda-feira (21/03), em vigor a partir de 5 de junho, é fruto de um trabalho de quase dez anos de reflexão, consulta e avaliação do Papa junto ao Conselho de Cardeais e várias realidades eclesiais. Durante a apresentação, o prefeito da Congregação das Causas dos Santos, Cardeal Marcello Semeraro, por sete anos secretário do Conselho de Cardeais, explicou como a nova constituição não apenas encerra um caminho, mas abre novas estradas para o futuro. No sentido de que poderia haver outras novidades além daquelas já introduzidas (leigos prefeitos, novos Dicastérios ou Dicastérios incorporados): “Se houver outras mudanças, o Papa as fará”. De facto, foi o que aconteceu com Paulo VI e João Paulo II, autores das duas constituições Regimini Ecclesiae universae (1967) e Pastor Bonus (1988).
Trabalho a longo prazo
É o princípio de “gradualidade” que o Papa Francisco no documento programático Evangelii Gaudium resumiu na expressão: “O tempo é superior ao espaço”, enfatizou Semeraro. “Isso torna possível trabalhar a longo prazo, sem a obsessão por resultados imediatos. Ajuda a suportar com paciência as situações difíceis e adversas, ou as mudanças de planos que o dinamismo da realidade impõe”.

Praedicate Evangelium faz “reflorescer” o Concílio
Outro princípio importante seguido na elaboração do documento é o de tradição, ou seja, “fidelidade à história e continuidade com o passado”. “Teria sido enganoso (além de fantasioso) pensar numa reforma que perturbaria todo o sistema curial”, esclareceu o cardeal. Praedicate Evangelium faz “reflorescer” as esperanças e expectativas do Concílio Vaticano II. “E isto é uma coisa bonita” que envia para o sótão antigos fantasmas sobre o próprio conceito de reforma: “Havia medo em usar este termo por causa de controvérsias passadas”.

Espaço para os leigos
Ao mesmo tempo, a nova constituição apostólica apresenta elementos decididamente inovadores. Um deles é o facto de que os leigos e leigas na Cúria podem assumir a liderança de Dicastérios ou outros organismos. Isto já aconteceu com a nomeação de um leigo, Paolo Ruffini, como Prefeito do Dicastério para a Comunicação: “Uma decisão que não foi improvisada pelo Papa; pelo contrário, foi estudada especificamente com a contribuição das autoridades competentes”. Uma escolha “timidamente” solicitada pelo Vaticano II, que tinha formulado e promovido uma “teologia do laicato”. Diante disso, deve ser considerada também a decisão de abandonar o termo “Congregação”, que remonta ao tempo de Sisto V, que supunha que os titulares da presidência das “Congregações” eram apenas cardeais. “Não é mais assim. O termo Dicastério sugere que, em princípio, todos os batizados podem exercer este ofício: clérigos, consagrados e leigos”.
Igualdade entre todos os baptizados
O padre jesuíta Gianfranco Ghirlanda, canonista e professor emérito da Gregoriana, observou em seu discurso o fato de que qualquer fiel nomeado como chefe do Dicastério “não tenha autoridade devido ao grau hierárquico que lhe é investido”, mas pela “potestade” que recebe do Papa. “Se o prefeito e o secretário de um Dicastério são bispos, isso não deve levar ao equívoco de que a sua autoridade vem do grau hierárquico recebido, como se agissem com um poder próprio. A potestade vicária para exercer um ofício é a mesma se for recebida de um bispo, presbítero, consagrado ou consagrada, leigo ou leiga”. Mais uma confirmação de que “o poder de governo na Igreja não vem do sacramento da Ordem, mas da missão canônica”. Por isso, “a igualdade fundamental entre todos os batizados é reafirmada, mesmo que na diferenciação e complementaridade”, disse Ghirlanda. Este “funda a sinodalidade”.

Nomeações e avaliações
Então os leigos podem ser nomeados prefeitos de qualquer Dicastério, incluindo a Secretaria de Estado, já que a Constituição fala de um secretário de Estado que não seja necessariamente um cardeal? “Há dicastérios nos quais é conveniente que haja leigos”, sublinhou o canonista, dando o exemplo do Dicastério para os Leigos, a Família e a Vida, que abrange setores que os leigos “vivem” e nos quais “têm experiência”. “Não há preclusão estabelecida”, disse Ghirlanda. Ao mesmo tempo, no caso dos Tribunais”, a Constituição não revoga o Código de Direito Canônico que afirma que em matéria de clérigos são os clérigos que julgam… A Igreja permanece com uma hierarquia. A função de um sacerdote ou bispo não é eliminada, depende das diferentes situações”. Sobre o mesmo assunto, dom Marco Mellino, secretário do Conselho de Cardeais desde 2020, esclareceu que “o leigo é nomeado para a competência particular daquele Dicastério”. É necessária uma avaliação ad hoc: “Não é algo que seja acionado automaticamente”.

Rotatividade e não centros de poder
No que diz respeito às competências, alguns jornalistas observaram como o prazo de cinco anos estabelecido para os funcionários dos Dicastérios – após o qual eles devem retornar à diocese ou, no máximo, serem reconfirmados por mais cinco anos – poderia ser redutor em termos de desenvolvimento de capacidades profissionais. A Ghirlanda respondeu: “É verdade que a experiência é adquirida pela prática, mas se a pessoa nesses cinco anos não faz nenhum progresso ou se vê que está ali para subir escadas, não vale a pena renovar. Se, por outro lado, nesses cinco anos deu frutos, pode ser confirmado. E não apenas uma vez, mas enquanto for considerada válida”. Certamente, disse o jesuíta, “as pessoas que permanecem muito tempo em posições de governo podem desenvolver centros de poder. E na Igreja, isso nunca é oportuno. A rotatividade traz novas ideias, novas capacidades, abertura.

Luta contra os abusos
Foco na coletiva de imprensa também sobre a questão da luta contra os abusos, agora corroborada pela integração da Pontifícia Comissão para a Proteção dos Menores no Dicastério para a Doutrina da Fé: “A Comissão tem a tarefa de prevenir tais crimes, a seção disciplinar do Dicastério deve conduzir a ‘acção criminal contra eles’, explicou o jesuíta. Esta unificação, acrescentou, é um sinal de “quanto a Igreja está trabalhando para evitar que delitos tão graves continuem sendo perpetrados” por sacerdotes, religiosos ou leigos que desempenham funções na Igreja. É importante dar a conhecer à opinião pública “o conjunto de esforços crescentes e significativos que a Igreja tem articulado nos últimos anos no que diz respeito à proteção dos menores”, disse o jesuíta, queixando-se da excessiva “ênfase” dos meios de comunicação nos escândalos, mais do que em “numa reflexão mais saudável sobre como combater o abuso sexual, não só na Igreja, mas também na sociedade”.

O papel das Conferências Episcopais
Por fim, uma palavra sobre a questão do poder do magistério das Conferências Episcopais, com base no princípio da “descentralização”. “O que é estabelecido por uma Conferência Episcopal não pode contradizer o magistério universal, senão se coloca fora da comunhão eclesial”, disse Ghirlanda. A nova constituição se colocada “no plano da comunhão eclesial entre os bispos, independentemente de ser um ato legislativo ou uma interpretação doutrinal”. “É importante que se crie uma comunhão mais profunda entre os bispos e a ‘Conferência Episcopal’, ressaltou Semeraro, dizendo ter assistido a uma reunião de uma Conferência Episcopal “onde se viam claramente duas partes. Isso não deve acontecer na Igreja”.

Vatican News

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